Sunday, September 10, 2006


Malhas do Império (*)



Na sua edição do passado dia 19 de Agosto, o insuspeito Expresso publicava uma reportagem sobre a Base das Lages, instalada na Ilha Terceira, tendo como pano de fundo os voos secretos da CIA e, mais recentemente, a passagem de cargueiros com “material bélico não ofensivo” – talvez espingardas de pressão de ar – destinado ao estado de Israel.
Numa altura em que aquele estado se encontrava empenhado numa forte ofensiva contra um país vizinho, onde estava a causar destruição e morte em grande escala, como bem se percebe através da comunicação social, entende-se, através da análise da reportagem, não só nas linhas como nas entrelinhas, quão difícil está a ser para os governantes portugueses explicarem a utilização da Base das Lages, como ponto de apoio de um país envolvido numa guerra que não nos diz respeito.
Na reportagem afirma-se que terão passado “na base açoreana, quatro a seis voos de cargueiros de Israel cuja carga não foi inspeccionada pelos militares portugueses”. Então como se sebe que se tratava de “material bélico não ofensivo”? Pela declaração dos passivos agentes israelitas? E se as autoridades portuguesas não autorizassem a utilização daquela base o que aconteceria? Pelo desenvolvimento da reportagem, ficamos, claramente, a perceber que tudo aconteceria como, na realidade, aconteceu.
É que, quem, de facto, põe e dispõe na Base das Lages é o governo dos EUA que não nos dá a mais pequena satisfação sobre o que lá se passa. Vejamos três exemplos mencionados:
1) Os tribunais portugueses estão totalmente impossibilitados de “fazerem aplicar e respeitar as sentenças de condenação da entidade patronal norte-americana em conflitos com trabalhadores ao serviço da Base”.
2) A autarquia da Praia da Vitória não consegue “exercer o seu poder político e administrativo sobre os espaços da cidade norte-americana que nasceu e cresceu nos últimos 20 anos”.
3) A arrogância e o abuso da força, que o Império detém, culminam com a “ausência, desde 1991, de quaisquer contrapartidas financeiras para a Região Autónoma”.
Há, como se vê, uma situação inequívoca de uma potência estrangeira que ocupa uma parte do território nacional, onde exerce plena soberania, ainda por cima, sem quaisquer compensações financeiras para a região ocupada e com a total aquiescência de vários governos que não mexeram uma palha para repor a legalidade. Não é por acaso que um especialista na matéria afirma: “Foi celebrado um Acordo Luso-Americano, mas está feito para não existir…” Significa isto que agrada a todas as partes? Porquê?
Pelo que ficou exposto e pela notória atrapalhação do governo, somos levados, facilmente, às seguintes conclusões: 1) A Base Aérea nº 4 da Força Aérea Portuguesa só existe no papel;2) Nas Lages está, de facto, instalada a 65 th Air Base Wing cujo “major comand” é a US Air Force Europe. São os EUA que concedem a Portugal algumas facilidades para poder lá estacionar dois helicópteros e um aviocar.
Como português, para além de repudiar completamente a complacência dos nossos governantes, nesta situação, também não posso deixar de criticar a oposição à esquerda do PS que tem revelado alguma moleza na sua denúncia.

Luís Moleiro Santos

(*) Texto publicado na edição de 7/9/06 do jornal “BARLAVENTO”

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