Tuesday, July 25, 2006

ENTREVISTA - MICHAEL WARSHAWSKI
Arrogância de Israel não permite o óbvio: trocar prisioneiros árabes pelos israelenses
Um dos mais respeitados analistas políticos da esquerda israelense, o escritor Michael Warshawski critica a subserviência de Israel ao projeto dos EUA de guerra preventiva e teme regionalização do conflito com entrada de Síria e Irã se comunidade internacional não intervier.
Verena Glass e Marcelo Netto Rodrigues*
SÃO PAULO - As incursões cada vez mais violentas do exército israelense sobre o território libanês no último final de semana foram destaque sem concorrência das manchetes e fotografias na imprensa internacional, ao mesmo tempo em que impulsionaram no mundo todo manifestações antiguerra, pelo cessar-fogo e contra o governo israelense.
Também no próprio coração de Israel a condenação aos ataques ao Líbano tomou as ruas, em uma manifestação que, segundo os organizadores, reuniu cerca de 5 mil manifestantes na capital Tel Aviv, no último sábado (22).
Segundo o jornal local Haaretz, o protesto teve, ao lado da “familiar exigência de demissão do primeiro-ministro e do ministro da Defesa”, um claro caráter antiamericano. Junto às palavras de ordem “nós não vamos matar, nós não vamos morrer em nome do Sionismo”, os manifestantes também repetiam “nós não vamos matar, nós não vamos morrer a serviço dos EUA”.O aumento do número de protestos internos contra a ação das forças armadas israelenses em Gaza e no Líbano tem fortalecido as campanhas de grandes nomes do movimento pacifista israelense, como o escritor e diretor do Centro de Informação Alternativa (www.alternativenews.org) de Jerusalém, Michael Warshawski.
“Apesar de repetir insistentemente as falas sobre ‘a ameaça árabe’, ‘o inimigo árabe’, ‘a ameaça muçulmana’ etc, os israelenses não entendem a ligação óbvia entre os massacres cometidos pelo exército israelense em Gaza e o contra-ataque dos ativistas libaneses. Assim, em quase sua totalidade eles ficaram surpresos e profundamente ofendidos: como as organizações libanesas se atrevem a atacar cidadãos israelenses sem nenhuma razão ou provocação da nossa parte? Viciados no uso unilateral da violência, os cidadãos do Estado de Israel estão estes dias totalmente desorientados e, como sempre, se abandonando a um forte sentimento de vitimização, como as vítimas do ódio global aos judeus”, escreveu Warshawski na última semana, em uma ácida critica à prepotência do unilateralismo israelense.
Em entrevista à Carta Maior e ao jornal Brasil de Fato por correio eletrônico, Warshawski, pedindo desculpas pela pressa
Warshawski
– “vocês vão entender, eu e meus camaradas estamos ocupadíssimos com a construção do movimento antiguerra” - comentou rapidamente o conflito a partir da perspectiva do movimento pacifista israelense.
Pergunta
- Qual é, na sua opinião, o objetivo primeiro da campanha militar israelense no Líbano, e em que grau os Estados Unidos estariam envolvidos?
Warshawski
- Israel se considera ponta de lança da Guerra global sem fim contra o terrorismo, à medida que o terrorismo vem sendo mais e mais identificado com islamismo.
O caso dos prisioneiros de guerra ou as operações militares do Hezbollah são apenas pretextos. O total apoio do governo americano, ou mais, o “conselho” aberto de George Bush a Israel para “não parar no meio” confirmam o fato de que essa guerra de Israel é, de fato, parte da interminável guerra preventiva dos EUA, com Israel assumindo servilmente o papel de linha-de-frente.
Pergunta
- Qual a sua avaliação sobre a demanda da resistência libanesa de negociar a libertação de seus prisioneiros em troca dos dois soldados israelenses feitos reféns pelo Hezbollah?
Warshawski
– O fato de que numa Guerra – e Israel afirma estar em Guerra com “os árabes” – existam prisioneiros de guerra é natural.
No passado, Israel estava aberto à troca de prisioneiros. Mas agora a arrogância israelense é tão grande que eles têm reais dificuldades para não fazer o óbvio, que seria soltar prisioneiros palestinos e libaneses em troca dos três soldados israelenses nas mãos do Hezbollah e do comando palestino.
De fato, no momento eles estão prontos a sacrificar seus próprios prisioneiros de guerra para não se comprometer com “terroristas”.
Pergunta
- Em Israel, como a população está se posicionando frente os ataques ao Líbano? Existe uma divisão na opinião pública?
Warshawski
- A grande maioria da população israelense infelizmente acredita que Israel foi atacado sem nenhuma razão, e que a ofensiva sobre o Líbano tem como objetivo proteger os israelenses da ameaça Hezbollah.
Não mais de 5% da população judia de Israel se opôs à guerra na primeira semana. Mas parece, no entanto, que lentamente mais e mais pessoas estão se perguntando: por quanto tempo? O que é o objetivo concreto desta guerra etc.
O fato de que o Hezbollah conseguiu dificultar a vida de centenas de israelenses e de provocar o medo, no entanto, acabou reduzindo a brutal arrogância de parte importante da população israelense.
Pergunta
- Como, a seu ver, o movimento pacifista poderia mudar ou influenciar a opinião pública em Israel?
Warshawski
– Temos que explicar que esta guerra nada tem a ver com a segurança de Israel ou com os prisioneiros de guerra, e que a sua base teórica/ideológica é suicida: uma guerra interminável com o Islã e com todo o mundo árabe.
Quem acredita que, pelo menos a longo prazo, Israel poderá sobreviver?
Calcado nisso, temos que construir o movimento antiguerra mais forte possível. O ato que realizamos neste sábado foi um primeiro sucesso nesse sentido: 5 mil manifestantes, árabes e judeus em Tel Aviv dizendo não à guerra no Líbano e em Gaza, aos crimes de guerra, e não à tomada de civis como reféns.
Pergunta
- Na sua avaliação, qual seria a melhor solução para o fim deste conflito?
Warshawski
Essa guerra continuará indefinidamente, com alguns cessar-fogo de tempos em tempos.
Neste caso específico, existem duas alternativas: ou uma intervenção internacional nos próximos dez dias, ou corremos o rico de uma regionalização do conflito com o envolvimento da Síria e do Irã.
*Marcelo Netto Rodrigues é repórter do Brasil de Fato

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