Artigo de João Vasconcelos publicado no semanário "Barlavento".
A Revolução Socialista Russa, a primeira que, no mundo, incluía no seu programa o fim da exploração do homem pelo homem, a abolição das classes, que iniciou a construção de uma sociedade socialista apontando o rumo do comunismo, ocorreu há 88 anos.
No dia 7 de Novembro de 1917 (25 de Outubro segundo o calendário Juliano, na altura em vigor na Rússia), os bolcheviques, sob a direcção de Lénine, promoveram a insurreição dos operários, dos soldados e dos camponeses do vasto Império Russo. Surgiu assim, um Estado de tipo novo, que pretendia colocar as riquezas ao serviço dos trabalhadores e da sociedade em geral. Uma revolução que vai modelar o Século XX, influenciando a luta da humanidade pela sua libertação e cujo exemplo, não obstante a derrota da primeira experiência socialista, inspira, cada vez mais em todo o mundo, novas lutas pela liberdade e pela justiça, a caminho de novas revoluções socialistas.
John Reed, na sua empolgante obra Dez Dias que Abalaram o Mundo, descreve de forma genial os acontecimentos revolucionários desses dias memoráveis. Lénine, em nota introdutória à obra de Reed, refere: «eis um livro que gostaria de ver publicado em milhões de exemplares e traduzido em todas as línguas», recomendando a sua leitura aos operários de todo o mundo. A Preparação da Insurreição
Não obstante o triunfo da Revolução Burguesa de Fevereiro, que derrubou a tirania czarista de Nicolau II, a crise económica e financeira da Rússia agravava-se rapidamente, com o rublo em desvalorizações contínuas, a fome e a miséria grassavam entre as massas trabalhadoras, as derrotas na frente russa sucediam-se, as tropas eram enviadas para sufocar os protestos, as greves adquiriam um carácter acentuadamente político, exigindo a entrega do poder aos Sovietes. Os bolcheviques colocavam-se à frente dos operários, exigindo o controlo operário, e dos camponeses, pela ocupação das terras.
O governo de Kerenski, desorientado, tomava medidas cada vez mais repressivas, proibindo os soldados de participar nas actividades políticas e ordenando a punição das acções dos camponeses. No entanto, o exército já não era seguro, recusando-se os soldados a reprimir os trabalhadores. Rebentam rebeliões nacionais na Ucrânia e no Cáucaso. A partir da clandestinidade em Vyborg, onde se encontrava, Lénine escreve a 29 de Setembro que a crise estava madura para a Revolução.
Chegado da clandestinidade a Petrogrado no dia 10 de Outubro, Lénine vai participar numa reunião do Comité Central do POSDR(b), onde se decidiu a constituição de um Bureau Político do CC para dirigir politicamente a insurreição.
No dia seguinte, reuniu-se no Instituto Smólni o Congresso dos Sovietes Deputados Operários e Soldados do Norte da Rússia, relatando que as massas estavam dispostas à insurreição e aprovando a resolução: «Só a passagem imediata de todo o Poder para os órgãos da Revolução, pode salvar o povo».
Foi criado em Petrogrado um Comité Militar Revolucionário, com as funções de dirigir a insurreição, integrando representantes do Soviete de Petrogrado, do CC da Esquadra do Báltico, do Comité Regional da Finlândia, dos comités de fábrica e da Organização Militar junto do CC do Partido Bolchevique. Nos dias seguintes, a exigência de passagem do poder para os Sovietes alastra por toda a Rússia. O Congresso dos Sovietes da Sibéria e da Ucrânia tomam idêntica posição e o Soviete de Moscovo decide armar os trabalhadores através dos estados-maiores da Guarda Vermelha.No dia 20 de Outubro, o Comité Militar Revolucionário nomeia comissários para todas as unidades militares de Petrogrado, e a seguir para as principais empresas da cidade.
No dia 21, a guarnição de Petrogrado através dos seus representantes decide apoiar o CMR, propondo para o dia 22, o Dia do Soviete de Petrogrado. Neste dia, realizam-se na cidade grandiosos comícios, em que os operários demonstram a sua força. As unidades militares passam-se cada vez mais para o campo da Revolução.
A 24 de Outubro, a tipografia do Rabótchi Put (A Via Operária), órgão central dos bolcheviques (o Pravda fora ilegalizado) sofreu um ataque do governo. O ministro da Justiça tenta prender Lénine e os alunos das escolas militares ocupam pontos nevrálgicos da cidade. Prepara-se o assalto a Smólni, quartel-general dos bolcheviquese e da insurreição. O tempo urge.
A Revolução Triunfa.
Nada melhor que John Reed para nos relatar o desencadear da Revolução, que se encontra no Instituto Smólni no dia 24 de Outubro: «na sala n.º 10 do último andar estava reunido em sessão permanente o Comité Revolucionário Militar, cuja presidência estava entregue a um rapaz de dezoito anos, muito louro, chamado Lazimir. Ao passar, parou para me apertar a mão, um tanto timidamente. «A Fortaleza de Pedro-e-Paulo acaba de passar para o nosso lado», disse-me com um sorriso de satisfação. «Há um minuto recebemos uma comunicação de um regimento que o Governo mandara vir para Petrogrado. Os soldados, desconfiados, pararam o comboio em Gatchina e enviaram-nos uma delegação. «Que se passa?», perguntaram. «Que tendes a dizer? Nós acabámos de votar a resolução Todo o Poder aos Sovietes...» O Comité Revolucionário Militar volveu-lhes: «Irmãos! Saudamo-vos em nome da Revolução. Fiquem onde estão até novas instruções!».
Neste dia, Kerenski perante o Conselho da República, no Palácio Marinski, ataca Lénine como um «criminoso político que anda escondido e cujo paradeiro tentamos descobrir...». Aqui, toma conhecimento duma nota emitida pelo Soviete de Petrogrado, ordenando a todos os regimentos que se pusessem em pé de guerra imediatamente. O II Congresso dos Sovietes da Rússia inicia os seus trabalhos na manhã do dia 25 de Outubro (7 de Novembro), enquanto a insurreição vitoriosa atingia o seu auge e o poder se encontrava nas mãos do Soviete de Petrogrado. Lénine dirigia pessoalmente a Revolução.
A Guarda Vermelha e as tropas revolucionárias ocuparam as estações de caminhos de ferro, o correio, o telégrafo, os ministérios e o Banco do Estado. O couraçado «Aurora» proclama uma nova era, a era da revolução socialista, fazendo troar os seus canhões apontados para o Palácio de Inverno, onde se refugiara o Governo Provisório. Este foi preso, excepto Kerenski que conseguiu fugir. O pré-Parlamento foi dissolvido.Lénine, no seu apelo Aos Cidadãos da Rússia, anuncia a passagem do poder do Estado para o Comité Militar Revolucionário, órgão do Soviete de Deputados Operários e Soldados de Petrogrado: «A causa pela qual o povo lutou – a proposta imediata de uma paz democrática, a supressão da propriedade latifundiária da terra, o controlo operário sobre a produção, a criação de um Governo Soviético – esta causa está assegurada. Viva a Revolução dos Operários, Soldados e Camponeses!».
No mesmo dia, o II Congresso dos Sovietes proclamou a passagem do poder para as mãos dos Sovietes, sendo constituído o Conselho dos Comissários do Povo, o primeiro Governo dos Sovietes, com Lénine como seu Presidente. Na noite de 26 de Outubro, o Congresso aprovou os célebres Decretos sobre a paz e sobre a terra.
A Revolução Socialista Russa, constituiu assim, o maior acontecimento político do século XX, ou melhor dizendo, o maior acontecimento da História da Humanidade, pois mostrou o caminho que esta terá de trilhar para conseguir a sua completa Libertação, não obstante a sua derrocada posterior. Numa época de globalização imperialista que protege cada vez mais os poderosos do planeta, novas experiências socialistas libertas dos erros do passado e melhor aperfeiçoadas verão chegar a sua vez. Os oprimidos e explorados do mundo encarregar-se-ão de tal desiderato.
João Vasconcelos*
*investigador de História e membro da Coordenadora Distrital do Bloco de Esquerda do Algarve
17 de Novembro de 2005 14:
No dia 7 de Novembro de 1917 (25 de Outubro segundo o calendário Juliano, na altura em vigor na Rússia), os bolcheviques, sob a direcção de Lénine, promoveram a insurreição dos operários, dos soldados e dos camponeses do vasto Império Russo. Surgiu assim, um Estado de tipo novo, que pretendia colocar as riquezas ao serviço dos trabalhadores e da sociedade em geral. Uma revolução que vai modelar o Século XX, influenciando a luta da humanidade pela sua libertação e cujo exemplo, não obstante a derrota da primeira experiência socialista, inspira, cada vez mais em todo o mundo, novas lutas pela liberdade e pela justiça, a caminho de novas revoluções socialistas.
John Reed, na sua empolgante obra Dez Dias que Abalaram o Mundo, descreve de forma genial os acontecimentos revolucionários desses dias memoráveis. Lénine, em nota introdutória à obra de Reed, refere: «eis um livro que gostaria de ver publicado em milhões de exemplares e traduzido em todas as línguas», recomendando a sua leitura aos operários de todo o mundo. A Preparação da Insurreição
Não obstante o triunfo da Revolução Burguesa de Fevereiro, que derrubou a tirania czarista de Nicolau II, a crise económica e financeira da Rússia agravava-se rapidamente, com o rublo em desvalorizações contínuas, a fome e a miséria grassavam entre as massas trabalhadoras, as derrotas na frente russa sucediam-se, as tropas eram enviadas para sufocar os protestos, as greves adquiriam um carácter acentuadamente político, exigindo a entrega do poder aos Sovietes. Os bolcheviques colocavam-se à frente dos operários, exigindo o controlo operário, e dos camponeses, pela ocupação das terras.
O governo de Kerenski, desorientado, tomava medidas cada vez mais repressivas, proibindo os soldados de participar nas actividades políticas e ordenando a punição das acções dos camponeses. No entanto, o exército já não era seguro, recusando-se os soldados a reprimir os trabalhadores. Rebentam rebeliões nacionais na Ucrânia e no Cáucaso. A partir da clandestinidade em Vyborg, onde se encontrava, Lénine escreve a 29 de Setembro que a crise estava madura para a Revolução.
Chegado da clandestinidade a Petrogrado no dia 10 de Outubro, Lénine vai participar numa reunião do Comité Central do POSDR(b), onde se decidiu a constituição de um Bureau Político do CC para dirigir politicamente a insurreição.
No dia seguinte, reuniu-se no Instituto Smólni o Congresso dos Sovietes Deputados Operários e Soldados do Norte da Rússia, relatando que as massas estavam dispostas à insurreição e aprovando a resolução: «Só a passagem imediata de todo o Poder para os órgãos da Revolução, pode salvar o povo».
Foi criado em Petrogrado um Comité Militar Revolucionário, com as funções de dirigir a insurreição, integrando representantes do Soviete de Petrogrado, do CC da Esquadra do Báltico, do Comité Regional da Finlândia, dos comités de fábrica e da Organização Militar junto do CC do Partido Bolchevique. Nos dias seguintes, a exigência de passagem do poder para os Sovietes alastra por toda a Rússia. O Congresso dos Sovietes da Sibéria e da Ucrânia tomam idêntica posição e o Soviete de Moscovo decide armar os trabalhadores através dos estados-maiores da Guarda Vermelha.No dia 20 de Outubro, o Comité Militar Revolucionário nomeia comissários para todas as unidades militares de Petrogrado, e a seguir para as principais empresas da cidade.
No dia 21, a guarnição de Petrogrado através dos seus representantes decide apoiar o CMR, propondo para o dia 22, o Dia do Soviete de Petrogrado. Neste dia, realizam-se na cidade grandiosos comícios, em que os operários demonstram a sua força. As unidades militares passam-se cada vez mais para o campo da Revolução.
A 24 de Outubro, a tipografia do Rabótchi Put (A Via Operária), órgão central dos bolcheviques (o Pravda fora ilegalizado) sofreu um ataque do governo. O ministro da Justiça tenta prender Lénine e os alunos das escolas militares ocupam pontos nevrálgicos da cidade. Prepara-se o assalto a Smólni, quartel-general dos bolcheviquese e da insurreição. O tempo urge.
A Revolução Triunfa.
Nada melhor que John Reed para nos relatar o desencadear da Revolução, que se encontra no Instituto Smólni no dia 24 de Outubro: «na sala n.º 10 do último andar estava reunido em sessão permanente o Comité Revolucionário Militar, cuja presidência estava entregue a um rapaz de dezoito anos, muito louro, chamado Lazimir. Ao passar, parou para me apertar a mão, um tanto timidamente. «A Fortaleza de Pedro-e-Paulo acaba de passar para o nosso lado», disse-me com um sorriso de satisfação. «Há um minuto recebemos uma comunicação de um regimento que o Governo mandara vir para Petrogrado. Os soldados, desconfiados, pararam o comboio em Gatchina e enviaram-nos uma delegação. «Que se passa?», perguntaram. «Que tendes a dizer? Nós acabámos de votar a resolução Todo o Poder aos Sovietes...» O Comité Revolucionário Militar volveu-lhes: «Irmãos! Saudamo-vos em nome da Revolução. Fiquem onde estão até novas instruções!».
Neste dia, Kerenski perante o Conselho da República, no Palácio Marinski, ataca Lénine como um «criminoso político que anda escondido e cujo paradeiro tentamos descobrir...». Aqui, toma conhecimento duma nota emitida pelo Soviete de Petrogrado, ordenando a todos os regimentos que se pusessem em pé de guerra imediatamente. O II Congresso dos Sovietes da Rússia inicia os seus trabalhos na manhã do dia 25 de Outubro (7 de Novembro), enquanto a insurreição vitoriosa atingia o seu auge e o poder se encontrava nas mãos do Soviete de Petrogrado. Lénine dirigia pessoalmente a Revolução.
A Guarda Vermelha e as tropas revolucionárias ocuparam as estações de caminhos de ferro, o correio, o telégrafo, os ministérios e o Banco do Estado. O couraçado «Aurora» proclama uma nova era, a era da revolução socialista, fazendo troar os seus canhões apontados para o Palácio de Inverno, onde se refugiara o Governo Provisório. Este foi preso, excepto Kerenski que conseguiu fugir. O pré-Parlamento foi dissolvido.Lénine, no seu apelo Aos Cidadãos da Rússia, anuncia a passagem do poder do Estado para o Comité Militar Revolucionário, órgão do Soviete de Deputados Operários e Soldados de Petrogrado: «A causa pela qual o povo lutou – a proposta imediata de uma paz democrática, a supressão da propriedade latifundiária da terra, o controlo operário sobre a produção, a criação de um Governo Soviético – esta causa está assegurada. Viva a Revolução dos Operários, Soldados e Camponeses!».
No mesmo dia, o II Congresso dos Sovietes proclamou a passagem do poder para as mãos dos Sovietes, sendo constituído o Conselho dos Comissários do Povo, o primeiro Governo dos Sovietes, com Lénine como seu Presidente. Na noite de 26 de Outubro, o Congresso aprovou os célebres Decretos sobre a paz e sobre a terra.
A Revolução Socialista Russa, constituiu assim, o maior acontecimento político do século XX, ou melhor dizendo, o maior acontecimento da História da Humanidade, pois mostrou o caminho que esta terá de trilhar para conseguir a sua completa Libertação, não obstante a sua derrocada posterior. Numa época de globalização imperialista que protege cada vez mais os poderosos do planeta, novas experiências socialistas libertas dos erros do passado e melhor aperfeiçoadas verão chegar a sua vez. Os oprimidos e explorados do mundo encarregar-se-ão de tal desiderato.
João Vasconcelos*
*investigador de História e membro da Coordenadora Distrital do Bloco de Esquerda do Algarve
17 de Novembro de 2005 14:
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