Friday, June 15, 2007

A Suspensão do Mandato dos Autarcas



A SUSPENSÃO DOS MANDATOS DOS AUTARCAS
João Vasconcelos (*)

Sobre a matéria que está em discussão, aceita - se o princípio de que “um autarca acusado definitivamente de um crime relacionado com o exercício das suas funções autárquicas deve suspender o mandato”. No entanto, a intenção do governo Sócrates em legislar sobre o assunto, tal como a solução apresentada pelo PSD em 2005, não deixam de ser consideradas “primárias”, visto tornar esse princípio obrigatório por lei. Note-se que o projecto de lei de 2005, ao qual o Bloco se opôs, foi aprovado com os votos favoráveis do Partido Socialista.

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Todas estas situações necessitam de ser construídas ao contrário. Em primeiro lugar devem - se ouvir especialistas de direito constitucional e a partir daqui terá de ser elaborado um diploma que não viole qualquer direito. Tem de se encontrar um instrumento que respeite a Constituição da República, salvaguardando sempre “o princípio da presunção da inocência”, um princípio fundamental do Direito português.
Aceita-se o princípio que é o da ética política – foi sempre o que o Bloco reclamou na política autárquica (e não só), desde que o Bloco é Bloco. Irá fazer caminho na sociedade portuguesa uma espécie de regra geral de conduta acerca destes casos, muito mais importante do que os automatismos de uma lei.
A posição do governo nesta altura, quando decorrem as eleições intercalares para a Câmara Municipal de Lisboa, em legislar, tornando obrigatória a suspensão de mandatos sempre que os autarcas sejam constituídos arguidos, é uma posição demagógica, populista e manifestamente eleitoralista. Todos vêem que o seu objectivo é, em parte, atacar a candidatura de Carmona Rodrigues (com vários arguidos) e favorecer o seu candidato oficial, António Costa. Por outro lado, esta intenção governamental, a concretizar-se, irá atribuir um poder absoluto ao Ministério Público, aos juízes, aos tribunais. Esta espécie de “Estado dentro do Estado” iria ver as suas competências, forças e atribuições reforçadas o que, diga-se em abono da verdade, não seria nada bom para o funcionamento do nosso regime democrático, sabendo-se como funciona, ou não funciona, a justiça neste país. Salvo raras excepções, os poderosos “safam-se” sempre e os mais fracos, os que têm razão e são inocentes, são muitas vezes condenados.

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Há que ter igualmente em atenção que há crimes e crimes, nem todos são da mesma natureza e do mesmo grau de intensidade. Será muito diferente um autarca ser acusado por uma simples denúncia anónima, sem qualquer fundamento, apenas por um intuito de vingança e desforra política, ou outro motivo qualquer, ou encontrar-se envolvido em graves acusações, tipo Apito Dourado, de Valentim Loureiro, em Gondomar, contas suíças de Isaltino Morais, em Oeiras, saco azul de Fátima Felgueiras, em Felgueiras, ou o caso Braga Parques de Carmona Rodrigues, em Lisboa – o princípio da boa ética e a regra de boa conduta ditavam que estas pessoas suspendessem os seus mandatos, ou não se recandidatassem, sem imposições legais.
Se o governo pretende efectivamente combater a corrupção a sério, então que tome medidas a sério, como por exemplo modificar a actual Lei das Finanças Locais, que aprovou e que só promove os chamados “impostos do betão”, e ponha um ponto final nas escandalosas mais valias urbanísticas.

(*) Professor, membro da Mesa Nacional do Bloco de Esquerda
e da Assembleia Metropolitana do Algarve

Observação: este artigo foi publicado no jornal Barlavento de 14 de Junho de 2007.

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