Friday, June 29, 2007

Assembleia Municipal Extraordinária de 28 de Junho de 2007


Assembleia Municipal Extraordinária de 28 de Junho de 2007
Comemoração dos 30 Anos do Poder Local Democrático
Intervenção de João Vasconcelos pelo BE na A. Municipal de Portimão


Sr. Presidente da Mesa da Assembleia
Sr. Presidente da Câmara Municipal
Srs. Vereadores e Srs. Membros da Assembleia Municipal
Minhas senhoras e meus senhores:

Sabemos que nem sempre está presente na memória, ou no conhecimento, que o poder local que hoje dispomos é um fruto de Abril. Efectivamente, foi com o 25 de Abril que passámos a ter Câmaras Municipais, Assembleias Municipais e Assembleias de Freguesia eleitas por sufrágio directo e universal, já lá vão 30 anos. Trata-se de uma importante conquista democrática das populações do nosso país.
Fazendo uma breve retrospectiva sobre a evolução do poder local ao longo destas três últimas décadas, constata-se que o primeiro período foi marcado pela rotura com a ditadura salazarista, com a nomeação em amplas assembleias das Comissões Administrativas, com uma grande mobilização popular na vida local e com a criação de formas de participação organizada, como por exemplo a formação de centenas de Comissões de Moradores por todo o país. Este período coincidiu com grandes transformações progressistas na sociedade portuguesa e com uma grande afirmação do papel dos trabalhadores e das populações na construção de um Portugal melhor.
À crescente reivindicação de grupos e de movimentos sociais, o poder autárquico responde com acções concretas procurando satisfazer as necessidades de base e a melhoria das suas condições de vida. A primeira legislação autárquica, datada de 1977 foi fortemente influenciada pela ascensão revolucionária popular, consagrando-se a autonomia, os Conselhos Municipais, a ampla participação nos órgãos e a delegação de competências nas Comissões e Associações de Moradores.
Numa segunda fase, arrefeceu o empenhamento ideológico e partidário, aumentando em contrapartida a vontade de liderança efectiva no âmbito do desenvolvimento. Centrado nos grupos político-partidários, o poder local ensaiou formas de dinamização dos agentes sociais e de utilização dos recursos disponíveis. Com a viragem à direita dos governos do Partido Socialista e dos governos da Aliança Democrática, a Lei das Finanças Locais de 1979 não é cumprida, sendo as autarquias espoliadas em milhões de contos pelo poder central.
Nova legislação foi sendo publicada sobre as competências das autarquias, traduzindo-se na diminuição do número de eleitos para os diversos órgãos, a marginalização das comissões e associações de moradores, a extinção dos conselhos municipais, a redução da importância dos órgãos deliberativos e o aumento dos poderes detidos pelos presidentes.
Com a entrada de Portugal na União Europeia e o acesso aos fundos comunitários, se por um lado permitiu o acesso a novos fundos, por outro, acentuou a dependência face ao poder central e às instâncias europeias, prejudicando assim a autonomia administrativa e financeira.
Em virtude da nova legislação, nos últimos tempos tem-se assistido entre os autarcas a uma preocupação crescente pela capacidade de gestão, conferindo-lhes um carácter técnico-pragmático cada vez maior. Os Presidentes de Câmara têm vindo a mudar o seu perfil de agentes predominantemente políticos para gestores e coordenadores de actividades no âmbito económico, promovendo a criação de infra-estruturas necessárias ao reforço do sistema produtivo e, noutras situações, as edilidades empregam parte das suas disponibilidades orçamentais em empreendimentos produtivos, considerados estratégicos para o desenvolvimento local. Neste sentido, tende a predominar as preocupações de ordem económica e administrativa em detrimento do crescimento social, segundo nos diz António Teixeira Fernandes.
A nova Lei das Finanças Locais da autoria do actual governo, penaliza fortemente o poder local autárquico, nomeadamente o do Algarve, onde se inclui Portimão naturalmente. O Poder Local Democrático, ao comemorar 30 anos da sua existência, merecia uma nova lei mais justa, solidária, descentralizadora e promotora de um desenvolvimento harmonioso e equilibrado do país. Trata-se de uma lei mais centralista que cria novas limitações e constrangimentos à autonomia do Poder Local, limita a capacidade financeira das autarquias, não contribui para o rigor e a transparência nas finanças locais, conduz ao aumento da dependência financeira das autarquias dos impostos associados à nova construção, os chamados “impostos do betão”, em vez de premiar as políticas de reabilitação, a valorização do património histórico e ecológico e a promoção da qualidade de vida, e contribui para o acentuar das assimetrias regionais.
Ao longo destes 30 anos muita coisa se fez no âmbito do poder local e é slogan preferido para muitos o “fez-se obra”. Se é certo que se fizeram muitas coisas positivas, também é verdade que foram tomadas muitas decisões que não se orientaram no sentido da melhoria da qualidade de vida dos cidadãos e das populações locais, bem pelo contrário. Uma das questões mais negativas tem sido o crescimento desenfreado do urbanismo e da betonização ao sabor da especulação imobiliária, em particular nas zonas do litoral, muitas vezes associadas a fenómenos de corrupção. Em vez de mais construções, o que importa verdadeiramente é apostar nas políticas de reabilitação, nos espaços verdes, nos equipamentos colectivos e dar prioridade às políticas sociais e da juventude. Uma melhor qualidade de vida para os cidadãos promovida pelos órgãos autárquicos só credibiliza o poder local democrático.
Muitos órgãos autárquicos têm-se vindo a afastar cada vez mais das pessoas, que não participam, nem são chamadas a participar nas decisões importantes do poder local, o que tem contribuído, em parte, para a grande abstenção que normalmente se verifica nas eleições autárquicas. Caso seja alterada a legislação autárquica no sentido de se criarem maiorias artificiais e executivos monocolores nas Câmaras Municipais, reforçando assim os poderes presidencialistas, só teríamos a perder, levando ainda mais ao afastamento das populações. Em vez de mais autoritarismo, o que nos faz falta é mais democracia e participação dos cidadãos.
Para terminar, nas relações existentes entre o poder local e o poder central, verifica-se que diversas competências, no âmbito de vários domínios e que deviam caber aos órgãos autárquicos, continuam centralizados ou foram atribuídas, ou preparam-se para a transferência, sem a correspondente distribuição de verbas – o que é inaceitável para o poder local. Por outro lado, este deverá rejeitar responsabilidades que por norma são da competência do poder central, devendo igualmente adoptar uma atitude menos passiva e mais mobilizadora das populações face a decisões arbitrárias por parte do Terreiro do Paço.
O Bloco de Esquerda, um partido novo no contexto do nosso quadro político-partidário, conseguiu nas últimas eleições para o poder local cerca de 250 autarcas a nível nacional. Um dos seus objectivos é crescer mais, lutando em prol dos interesses e reivindicações das populações, nomeadamente a nível local. Dando prioridade aos cidadãos, somos uma oposição construtiva mas também pugnamos por uma sociedade e um poder alternativos – também aqui, em Portimão. É o que vamos ver no futuro.


Muito obrigado pela vossa atenção.

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