Sr. Presidente da Câmara Municipal de Portimão
Srs. Vereadores e Srs. Membros da Assembleia Municipal
Excelªs. Autoridades aqui presentes
Excelºs. familiares de Teixeira Gomes
Minhas senhores e meus senhores,
Estamos hoje aqui a comemorar os 81 anos da elevação de Portimão a cidade, que ocorreu no dia 11 de Dezembro de 1924 pela mão do então Presidente da República, Manuel Teixeira Gomes, distinto democrata e insigne filho desta terra. Viajante famoso, diplomata hábil, político íntegro e apaixonado, Teixeira Gomes ocupou a mais alta magistratura da Nação, há 80 anos atrás, numa época deveras conturbada tanto à escala internacional, como no plano nacional.
Internacionalmente, e após o apocalipse da 1ª Guerra Mundial provocado pelas potências capitalistas, assiste-se às investidas revolucionárias de trabalhadores e vastas camadas populares que aspiravam à liberdade e à dignidade, guiadas pelo exemplo da experiência bolchevique. Mas também se assiste, como resposta às movimentações populares, ao avanço das forças negras e obscurantistas que não queriam perder privilégios e preparavam uma nova barbárie – os fascismos, já implantados na Itália por Mussolini e, em Espanha, por Primo de Rivera.
No plano interno, o Portugal republicano estava a ser consumido por uma das piores crises da sua história e, o mais paradoxal, é que os principais protagonistas dessa crise, foram aqueles que inauguraram uma nova época – a República, prometendo prosperidade, justiça social e paz. A República, esse “Dies Irae” anunciado e não cumprido, que substituiu uma Monarquia velha, cinzenta e decrépita, viu-se envolta na crise política, social e financeira, na repressão social e sindical, na corrupção venal, na acumulação de privilégios e prebendas, só para alguns, no avassalar da miséria e da fome para a grande maioria da população. Daqui até ao 28 de Maio de 1926 e à Ditadura Militar foi apenas um pequeno passo. E o “Salvador da Pátria” de Santa Comba, (curiosamente há alguns hoje que ainda se acham “salvadores da pátria” em crise), esperava a sua vez para mergulhar Portugal num inferno de quase meio século. Teixeira Gomes, desiludido com um regime em que acreditara e sonhara diferente, retirou-se para o seu exílio de Bougie.
A História não se repete. No entanto, os ciclos históricos embora diferentes e distantes no tempo, carreiam características com algumas semelhanças. Vivemos uma época de globalização armada geradora de guerras imperiais e terrorismo islâmico. Uma nova barbárie em larga escala se prenuncia, onde um dos expoentes máximos tem sido a guerra genocída do Iraque. Todavia, existe um outro caminho alternativo, uma globalização alternativa. Onde há repressão há resistência e luta e esse tem sido o caminho percorrido pelos movimentos sociais, pelas resistências do Iraque e Palestina ocupados, pelos imigrantes desenraizados, pelos povos e trabalhadores que lutam tenazmente contra os poderosos que lhes querem sonegar direitos conquistados nos últimos cem anos.
Tal como no tempo de Teixeira Gomes, há um século atrás, hoje, a Humanidade debate-se no essencial, com o mesmo tipo de problemas: aspira a libertar-se do sistema de exploração a que está sujeita, pugna por direitos básicos, como o direito ao trabalho, à saúde e à educação, quer justiça social e democracia efectiva. Nunca se produziu tanta riqueza como na actualidade, no entanto encontra-se terrivelmente mal distribuída: 816 milhões de pessoas passam fome e 6 milhões de crianças morrem anualmente por falta de comida; cerca de 200 milhões não têm trabalho; a fortuna dos três homens mais ricos de mundo (Bill Gates, Paul Allen e Warren Buffet) equivale à de 600 milhões de pessoas ou de 40 nações inteiras; os 365 indivíduos mais ricos do mundo detêm uma riqueza que excede os ganhos anuais de 40% da Humanidade; enquanto que 15% de privilegiados gozam de 56% do consumo mundial, 2,8 milhões de pessoas vivem com menos de 2 euros por dia, só para dar alguns exemplos. Ainda há quem diga que a luta de classes acabou? Nunca como hoje ela faz tanto sentido! O carro da História humana pode atrasar-se, ou até regredir temporariamente, mas retomará a marcha inelutavelmente e até recuperando o tempo perdido.
E que dizer da nossa situação política actual? Tem muitas parecenças com os últimos dias da República de Teixeira Gomes: os partidos políticos ganham as eleições mentindo ao povo, corrupção generalizada, repressão social e patronal, os ricos ficam dada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres. A fortuna avaliada das 10 famílias portuguesas mais ricas, onde se destacam Belmiro de Azevedo, José Manuel de Mello, João Pereira Coutinho, Joe Berardo, Espírito Santo e Alves Ribeiro, atinge a soma de 7 552 milhões de euros, o equivalente ao rendimento anual de cerca de 2 milhões de pensionistas e reformados do sistema público de segurança social. Só no 1º trimestre de 2005, os 4 maiores bancos privados portugueses tiveram um lucro de 727 milhões de euros. 20% dos mais ricos controlam 45,9% do rendimento nacional. Enquanto isto, 19% da população portuguesa encontra-se em situação de pobreza e mais de 200 mil passam fome. Cerca de 1 milhão e cem mil pensionistas e reformados auferem uma pensão de menos de 200 € por mês! Onde está o direito à vida, a uma cidadania sem exclusões, o direito à dignidade para estas pessoas? Onde pára a consciência social de governantes, que ainda por cima se dizem socialistas? Trata-se de um colossal embuste!
O governo Sócrates seguiu e até agravou as políticas neo-liberais dos governos conservadores de Barroso, Santana Lopes e Paulo Portas: aumento do IVA e de outros impostos, corte nos investimentos, ofensiva vergonhosa contra os trabalhadores da administração pública e restrições aos direitos sociais, como o aumento da idade da reforma, o desemprego agravou-se atingindo mais de meio milhão de desempregados. Ataca-se e procura-se destruir tudo o que tenha a ver com o Estado social, curiosamente em nome desse mesmo Estado social. São sempre os mesmos a apertar o cinto e a pagar a crise que não provocaram – os trabalhadores e o povo português.
Decretam-se aumentos ridículos de 37 cêntimos em salários miseráveis de milhões de portugueses e aumento da idade da reforma para 65 anos, enquanto outros, sempre os mesmos, não se aplica a mesma política. Vejam-se os casos de Santana Lopes, reformado aos 49 anos com cerca de 700 contos por mês; Vasco Franco, reformado aos 53 anos e auferindo reformas mais ordenado de Deputado no valor total de mil e 60 contos! E que dizer dos ordenados mensais milionários, como mais de 29 mil € para o Presidente da CGD; mais de 19 mil € para o Governador do Banco de Portugal; cerca de 16 mil para o Presidente das Águas de Portugal; o Presidente da Galp ganha cerca de 30 mil. Estes são apenas alguns dos números da desigualdade que grassa em Portugal.
Mas, Manuel Teixeira Gomes também foi escritor, deixando-nos obras notáveis como Inventário de Junho, Sabina Freire, Agosto Azul, Novelas Eróticas e Londres Maravilhosa, entre outras. Como ilustre Portimonense que foi, a sua veia literária deteve-se e descreveu de forma poética as maravilhas da nossa cidade. Em Agosto Azul, considerou o troço da costa da Praia da Rocha até à baía de Lagos, como “a realização perfeita da paisagem marítima grega, tal como os poetas da antiguidade a conceberam”. O político escritor não imaginava que, nos finais do século XX e inícios do século XXI, a sua “paisagem grega” fora mutilada e dilacerada irremediavelmente por blocos e torres de betão, a construção de uma marina com centenas de apartamentos em plena praia e em pleno rio, considerados domínios de espaço público, subvertendo o equilíbrio ambiental e ecológico do rio Arade. Como se isto não bastasse, continua a betonização da Praia da Rocha e, pasme-se, vão ser implantados ao longo de toda a praia, novos apoios de praia construídos em alumínio, tipo carruagens de comboio. Será mais um atentado ambiental, a somar a tantos outros, com consequências desastrosas no futuro, além de prejudicar particularmente os pequenos empresários instalados na zona, pois não dispõem de somas astronómicas, nem de capacidade de endividamento para suportar as novas estruturas, só lhes restando a expulsão e o desemprego. E estes tinham um projecto, mais económico e mais equilibrado ambientalmente que foi rejeitado pelas entidades responsáveis. A Câmara de Portimão devia ter sido a primeira a abraçar este projecto mas não o fez, antes associando-se ao modelo imposto pela CCDRA. Mas ainda vai a horas, desde que haja vontade política para tal, para remediar a situação.
Quanto à Ria de Alvor, considerada zona de protecção da Natureza, encontra-se na rota das imobiliárias do betão se nada for feito. Será que estamos perante um plano, já em andamento e à espera dos novos PROTAL e PDM, de betonização da Quinta da Rocha? Sabemos que a Quinta da Rocha, antes considerada como rústica, actualmente considera-se prédio misto em virtude de terem sido construídos 18 urbanos, destinados a habitação, antes omissos na matriz até 2001, compostos por 5T1, 3T2, 3T3, 4T4, 2T5 e 1T7, pertencentes à firma Butwell Trading Serviços e Investimentos S A Zona Franca da Madeira, com sede no Funchal. Qual a razão que não foi esta situação tornada pública? Saberá a Câmara de Portimão e até outras entidades o que se passa? Em nome da defesa do ambiente, da qualidade de vida e da transparência, os cidadãos exigem saber o que se passa. E em nome da memória de Teixeira Gomes!
Uma cidade com futuro, passa pela defesa de um bom ambiente/ordenamento, pela coesão social e económica e pela transparência e participação dos cidadãos. Uma cidade inundada de betão, degrada a qualidade de vida dos cidadãos e não tem futuro. Por isso considero um erro estratégico a aposta na construção de mais uma cidadela de cimento na zona do Barranco do Rodrigo, a troco de um Complexo Desportivo. O preço a pagar por todos nós e pelas gerações futuras será terrivelmente bem mais elevado.
Uma cidade (e um Concelho) com um projecto de desenvolvimento equilibrado e sustentado rumo ao futuro, assenta, como disse, também na satisfação social e económica. Há fome no nosso Concelho, há pessoas que vão aos contentores do lixo para sobreviver, há gente que vive ao relento, ou que vive em condições de habitação indignas. O poder central é culpado desta situação, mas não só. Compete às autoridades municipais velar igualmente para que os seus concidadãos vivam sem exclusão social. Para tal, devem implementar mais habitação social, mas de qualidade, requalificar os bairros sociais, em diálogo e como forma de combater a marginalidade e a insegurança. Deverá ser feito, o mais rápido possível, um levantamento sobre as manchas de pobreza no Concelho e implementar um Centro Comunitário, com forma de atender aos mais carenciados. E o comércio tradicional, um dos elos da economia local e como memória colectiva, necessita de ser mais apoiado e acarinhado. Importa haver um equilíbrio entre o comércio tradicional e as grandes superfícies.
Uma boa educação e uma boa cultura, também deverão ser preocupações das entidades camarárias. Torna-se prioritário o investimento numa rede municipal de creches e jardins de infância gratuitos para que as famílias de Portimão, Alvor e Mexilhoeira Grande lá possam colocar os seus filhos, sem ter de recorrer a despesas insuportáveis nos privados. Não são só as provas de motonáutica, o raly Lisboa-Dakar e alguns espectáculos musicais só acessíveis a elites que são importantes. Importa promover realizações culturais acessíveis à generalidade dos nossos cidadãos. E as modalidades desportivas deverão orientar-se servindo os jovens e a generalidade da população.
Hoje, o combate político trava-se pelas alternativas, pela diferença contra a indiferença. Torna-se premente construir uma sociedade, inclusive à escala local, de forma democrática, exigente e participada, privilegiando o desenvolvimento sustentável e integrando o ambiental com o social e o económico, que recusa a pobreza, a corrupção, o declínio e a marginalização das populações e dois territórios. Em Portimão também é preciso. Só assim estaremos a ser dignos da memória do Presidente Manuel Teixeira Gomes, aquele que elevou este Município a Cidade.
Muito obrigado pela vossa atenção.
João Vasconcelos, Membro da Assembleia Municipal – Bloco de Esquerda
Internacionalmente, e após o apocalipse da 1ª Guerra Mundial provocado pelas potências capitalistas, assiste-se às investidas revolucionárias de trabalhadores e vastas camadas populares que aspiravam à liberdade e à dignidade, guiadas pelo exemplo da experiência bolchevique. Mas também se assiste, como resposta às movimentações populares, ao avanço das forças negras e obscurantistas que não queriam perder privilégios e preparavam uma nova barbárie – os fascismos, já implantados na Itália por Mussolini e, em Espanha, por Primo de Rivera.
No plano interno, o Portugal republicano estava a ser consumido por uma das piores crises da sua história e, o mais paradoxal, é que os principais protagonistas dessa crise, foram aqueles que inauguraram uma nova época – a República, prometendo prosperidade, justiça social e paz. A República, esse “Dies Irae” anunciado e não cumprido, que substituiu uma Monarquia velha, cinzenta e decrépita, viu-se envolta na crise política, social e financeira, na repressão social e sindical, na corrupção venal, na acumulação de privilégios e prebendas, só para alguns, no avassalar da miséria e da fome para a grande maioria da população. Daqui até ao 28 de Maio de 1926 e à Ditadura Militar foi apenas um pequeno passo. E o “Salvador da Pátria” de Santa Comba, (curiosamente há alguns hoje que ainda se acham “salvadores da pátria” em crise), esperava a sua vez para mergulhar Portugal num inferno de quase meio século. Teixeira Gomes, desiludido com um regime em que acreditara e sonhara diferente, retirou-se para o seu exílio de Bougie.
A História não se repete. No entanto, os ciclos históricos embora diferentes e distantes no tempo, carreiam características com algumas semelhanças. Vivemos uma época de globalização armada geradora de guerras imperiais e terrorismo islâmico. Uma nova barbárie em larga escala se prenuncia, onde um dos expoentes máximos tem sido a guerra genocída do Iraque. Todavia, existe um outro caminho alternativo, uma globalização alternativa. Onde há repressão há resistência e luta e esse tem sido o caminho percorrido pelos movimentos sociais, pelas resistências do Iraque e Palestina ocupados, pelos imigrantes desenraizados, pelos povos e trabalhadores que lutam tenazmente contra os poderosos que lhes querem sonegar direitos conquistados nos últimos cem anos.
Tal como no tempo de Teixeira Gomes, há um século atrás, hoje, a Humanidade debate-se no essencial, com o mesmo tipo de problemas: aspira a libertar-se do sistema de exploração a que está sujeita, pugna por direitos básicos, como o direito ao trabalho, à saúde e à educação, quer justiça social e democracia efectiva. Nunca se produziu tanta riqueza como na actualidade, no entanto encontra-se terrivelmente mal distribuída: 816 milhões de pessoas passam fome e 6 milhões de crianças morrem anualmente por falta de comida; cerca de 200 milhões não têm trabalho; a fortuna dos três homens mais ricos de mundo (Bill Gates, Paul Allen e Warren Buffet) equivale à de 600 milhões de pessoas ou de 40 nações inteiras; os 365 indivíduos mais ricos do mundo detêm uma riqueza que excede os ganhos anuais de 40% da Humanidade; enquanto que 15% de privilegiados gozam de 56% do consumo mundial, 2,8 milhões de pessoas vivem com menos de 2 euros por dia, só para dar alguns exemplos. Ainda há quem diga que a luta de classes acabou? Nunca como hoje ela faz tanto sentido! O carro da História humana pode atrasar-se, ou até regredir temporariamente, mas retomará a marcha inelutavelmente e até recuperando o tempo perdido.
E que dizer da nossa situação política actual? Tem muitas parecenças com os últimos dias da República de Teixeira Gomes: os partidos políticos ganham as eleições mentindo ao povo, corrupção generalizada, repressão social e patronal, os ricos ficam dada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres. A fortuna avaliada das 10 famílias portuguesas mais ricas, onde se destacam Belmiro de Azevedo, José Manuel de Mello, João Pereira Coutinho, Joe Berardo, Espírito Santo e Alves Ribeiro, atinge a soma de 7 552 milhões de euros, o equivalente ao rendimento anual de cerca de 2 milhões de pensionistas e reformados do sistema público de segurança social. Só no 1º trimestre de 2005, os 4 maiores bancos privados portugueses tiveram um lucro de 727 milhões de euros. 20% dos mais ricos controlam 45,9% do rendimento nacional. Enquanto isto, 19% da população portuguesa encontra-se em situação de pobreza e mais de 200 mil passam fome. Cerca de 1 milhão e cem mil pensionistas e reformados auferem uma pensão de menos de 200 € por mês! Onde está o direito à vida, a uma cidadania sem exclusões, o direito à dignidade para estas pessoas? Onde pára a consciência social de governantes, que ainda por cima se dizem socialistas? Trata-se de um colossal embuste!
O governo Sócrates seguiu e até agravou as políticas neo-liberais dos governos conservadores de Barroso, Santana Lopes e Paulo Portas: aumento do IVA e de outros impostos, corte nos investimentos, ofensiva vergonhosa contra os trabalhadores da administração pública e restrições aos direitos sociais, como o aumento da idade da reforma, o desemprego agravou-se atingindo mais de meio milhão de desempregados. Ataca-se e procura-se destruir tudo o que tenha a ver com o Estado social, curiosamente em nome desse mesmo Estado social. São sempre os mesmos a apertar o cinto e a pagar a crise que não provocaram – os trabalhadores e o povo português.
Decretam-se aumentos ridículos de 37 cêntimos em salários miseráveis de milhões de portugueses e aumento da idade da reforma para 65 anos, enquanto outros, sempre os mesmos, não se aplica a mesma política. Vejam-se os casos de Santana Lopes, reformado aos 49 anos com cerca de 700 contos por mês; Vasco Franco, reformado aos 53 anos e auferindo reformas mais ordenado de Deputado no valor total de mil e 60 contos! E que dizer dos ordenados mensais milionários, como mais de 29 mil € para o Presidente da CGD; mais de 19 mil € para o Governador do Banco de Portugal; cerca de 16 mil para o Presidente das Águas de Portugal; o Presidente da Galp ganha cerca de 30 mil. Estes são apenas alguns dos números da desigualdade que grassa em Portugal.
Mas, Manuel Teixeira Gomes também foi escritor, deixando-nos obras notáveis como Inventário de Junho, Sabina Freire, Agosto Azul, Novelas Eróticas e Londres Maravilhosa, entre outras. Como ilustre Portimonense que foi, a sua veia literária deteve-se e descreveu de forma poética as maravilhas da nossa cidade. Em Agosto Azul, considerou o troço da costa da Praia da Rocha até à baía de Lagos, como “a realização perfeita da paisagem marítima grega, tal como os poetas da antiguidade a conceberam”. O político escritor não imaginava que, nos finais do século XX e inícios do século XXI, a sua “paisagem grega” fora mutilada e dilacerada irremediavelmente por blocos e torres de betão, a construção de uma marina com centenas de apartamentos em plena praia e em pleno rio, considerados domínios de espaço público, subvertendo o equilíbrio ambiental e ecológico do rio Arade. Como se isto não bastasse, continua a betonização da Praia da Rocha e, pasme-se, vão ser implantados ao longo de toda a praia, novos apoios de praia construídos em alumínio, tipo carruagens de comboio. Será mais um atentado ambiental, a somar a tantos outros, com consequências desastrosas no futuro, além de prejudicar particularmente os pequenos empresários instalados na zona, pois não dispõem de somas astronómicas, nem de capacidade de endividamento para suportar as novas estruturas, só lhes restando a expulsão e o desemprego. E estes tinham um projecto, mais económico e mais equilibrado ambientalmente que foi rejeitado pelas entidades responsáveis. A Câmara de Portimão devia ter sido a primeira a abraçar este projecto mas não o fez, antes associando-se ao modelo imposto pela CCDRA. Mas ainda vai a horas, desde que haja vontade política para tal, para remediar a situação.
Quanto à Ria de Alvor, considerada zona de protecção da Natureza, encontra-se na rota das imobiliárias do betão se nada for feito. Será que estamos perante um plano, já em andamento e à espera dos novos PROTAL e PDM, de betonização da Quinta da Rocha? Sabemos que a Quinta da Rocha, antes considerada como rústica, actualmente considera-se prédio misto em virtude de terem sido construídos 18 urbanos, destinados a habitação, antes omissos na matriz até 2001, compostos por 5T1, 3T2, 3T3, 4T4, 2T5 e 1T7, pertencentes à firma Butwell Trading Serviços e Investimentos S A Zona Franca da Madeira, com sede no Funchal. Qual a razão que não foi esta situação tornada pública? Saberá a Câmara de Portimão e até outras entidades o que se passa? Em nome da defesa do ambiente, da qualidade de vida e da transparência, os cidadãos exigem saber o que se passa. E em nome da memória de Teixeira Gomes!
Uma cidade com futuro, passa pela defesa de um bom ambiente/ordenamento, pela coesão social e económica e pela transparência e participação dos cidadãos. Uma cidade inundada de betão, degrada a qualidade de vida dos cidadãos e não tem futuro. Por isso considero um erro estratégico a aposta na construção de mais uma cidadela de cimento na zona do Barranco do Rodrigo, a troco de um Complexo Desportivo. O preço a pagar por todos nós e pelas gerações futuras será terrivelmente bem mais elevado.
Uma cidade (e um Concelho) com um projecto de desenvolvimento equilibrado e sustentado rumo ao futuro, assenta, como disse, também na satisfação social e económica. Há fome no nosso Concelho, há pessoas que vão aos contentores do lixo para sobreviver, há gente que vive ao relento, ou que vive em condições de habitação indignas. O poder central é culpado desta situação, mas não só. Compete às autoridades municipais velar igualmente para que os seus concidadãos vivam sem exclusão social. Para tal, devem implementar mais habitação social, mas de qualidade, requalificar os bairros sociais, em diálogo e como forma de combater a marginalidade e a insegurança. Deverá ser feito, o mais rápido possível, um levantamento sobre as manchas de pobreza no Concelho e implementar um Centro Comunitário, com forma de atender aos mais carenciados. E o comércio tradicional, um dos elos da economia local e como memória colectiva, necessita de ser mais apoiado e acarinhado. Importa haver um equilíbrio entre o comércio tradicional e as grandes superfícies.
Uma boa educação e uma boa cultura, também deverão ser preocupações das entidades camarárias. Torna-se prioritário o investimento numa rede municipal de creches e jardins de infância gratuitos para que as famílias de Portimão, Alvor e Mexilhoeira Grande lá possam colocar os seus filhos, sem ter de recorrer a despesas insuportáveis nos privados. Não são só as provas de motonáutica, o raly Lisboa-Dakar e alguns espectáculos musicais só acessíveis a elites que são importantes. Importa promover realizações culturais acessíveis à generalidade dos nossos cidadãos. E as modalidades desportivas deverão orientar-se servindo os jovens e a generalidade da população.
Hoje, o combate político trava-se pelas alternativas, pela diferença contra a indiferença. Torna-se premente construir uma sociedade, inclusive à escala local, de forma democrática, exigente e participada, privilegiando o desenvolvimento sustentável e integrando o ambiental com o social e o económico, que recusa a pobreza, a corrupção, o declínio e a marginalização das populações e dois territórios. Em Portimão também é preciso. Só assim estaremos a ser dignos da memória do Presidente Manuel Teixeira Gomes, aquele que elevou este Município a Cidade.
Muito obrigado pela vossa atenção.
João Vasconcelos, Membro da Assembleia Municipal – Bloco de Esquerda
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