Wednesday, April 19, 2006

ANGOLA



SÓCRATES EM ANGOLA
João Vasconcelos

Na sua deslocação a Angola José Sócrates fez-se acompanhar por 10 membros do seu governo e por 70 dos maiores empresários do nosso país. Nesta “corrida de fundo e com pesos pesados” ao país de José Eduardo dos Santos, muitos interesses estão em jogo, essencialmente políticos e económicos.
Depois de 40 anos de guerra e de 4 anos de paz, Angola perfila-se como um dos centros bem atractivos para o investimento estrangeiro e os homens de negócios portugueses não querem perder esta oportunidade numa região onde abunda o petróleo, os diamantes… e também a corrupção. A privatização da economia angolana nos moldes da globalização “selvagem” neo-liberal é do agrado da banca e das grandes construtoras, assim como do governo Sócrates. Lá como cá, a receita é a mesma: liberalização e desregulação (se é que ainda há algumas regras) da economia, exploração intensiva de mão-de-obra, salários baixos e chorudas negociatas.
Para já, não se vislumbra o “regresso” dos portugueses às terras da África Austral. É bem possível que isso aconteça para alguns técnicos e quadros intermédios, mas não para um conjunto significativo de portugueses. Os empresários, na mira de lucros rápidos e fáceis não estão na disposição de “abrir os cordões à bolsa” com os trabalhadores portugueses, antes pensarão em aplicar a directiva Bolkenstein em África.
Sócrates e os grupos empresariais portugueses (tal como os grupos concorrenciais estrangeiros) sabem quanto poderão valer as privatizações angolanas nos sectores da construção, energia, telecomunicações e outros negócios. Sócrates, os seus ministros, secretários de Estado e respectiva comitiva empresarial só se preocuparam com os milhões angolanos. Nem uma única palavra se ouviu a respeito da defesa dos direitos humanos que não existe em Angola, ou sobre o governo corrupto de José Eduardo dos Santos.
O primeiro-ministro fingiu que a antiga colónia portuguesa é um Estado democraticamente normal e esqueceu a violação dos direitos humanos e a não realização de eleições livres e democráticas. E nem tão pouco teve qualquer reunião com partidos da oposição, ou com qualquer ONG.
Como se sabe, José Eduardo dos Santos é um dos homens mais ricos de África e a sua família, os seus ministros e generais controlam praticamente todo o tecido económico e empresarial angolano. A par de toda esta riqueza abjecta e imoral, em que o governo dispõe de uma soma global de 12,5 mil milhões de euros provenientes da exploração petrolífera para gastar todos os anos ao longo da próxima década, existem milhões de angolanos que apenas possuem um euro por dia para gastar. Em Luanda podem observar-se condomínios de luxo, dotados de piscina, no meio de musseques onde falta a água e alastra a epidemia de cólera.
Nalguns locais da capital bebem-se taças de champanhe nas esplanadas viradas para o mar, enquanto noutros o povo angolano “estoira” de fome e de sede! E Angola está em 2º lugar a nível mundial nos índices de mortalidade infantil! É este o “paraíso” de José Eduardo dos Santos que Sócrates calou e que os empresários almejam. O 1º ministro de Portugal não é apenas mestre na arte da propaganda (veja-se o SIMPLEX e o PRACE), também denota uma fecunda habilidade na arte do esquecimento… propositado!
José Eduardo dos Santos e o seu governo terão de andar depressa. O povo angolano já não aguenta mais a miséria, o desemprego, a falta de água e de luz, a falta de educação e dos cuidados de saúde, a ausência de liberdade e de democracia. À semelhança de tantos países africanos, Angola poderá ser palco de violentas explosões sociais, o que adiará mais uma vez o regresso dos empresários portugueses e de outros nacionais, quiçá à procura de alguma quimera neo-colonialista.

Obs: este artigo foi publicado no jornal Barlavento, no dia 13 de Abril de 2006.

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