O abandono da reforma agrária no Brasil
Mateus Alves
Uma das principais bandeiras durante a campanha de Lula em 2002, o avanço da reforma agrária no Brasil parece ter sido deixado de lado nestes três anos de governo petista.
O PNRA (Plano Nacional de Reforma Agrária), encomendado pelo governo em seu primeiro ano, mal saiu do papel; em seu lugar, os petistas optaram pela criação do II PNRA, com medidas mais amenas e tímidas do que as propostas do primeiro documento.
Mesmo não sendo o esperado pelos movimentos sociais ligados à luta pela terra, o II PNRA obteve também o apoio destes, uma vez que buscavam acordar com o governo – supostamente a favor dos que há séculos lutavam pela conquista da divisão das terras no Brasil – um projeto de reforma agrária que cumprisse com as demandas básicas das milhares de famílias pertencentes às entidades.Embora recentemente o governo esteja dizendo que as metas acertadas no plano estão sendo cumpridas, a realidade é muito diferente. Das 127,5 mil famílias que o governo Lula diz ter assentado em 2005, apenas 45,7% o foram em áreas destinadas à reforma agrária. O restante, de acordo com o banco de dados da Luta pela Terra, está em assentamentos temporários ou em assentamentos reordenados em terras públicas.
O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) não tardou em contestar os números divulgados pelo governo e constatar que, na verdade, os petistas não estão alterando a estrutura fundiária do país. De acordo com João Paulo Rodrigues, dirigente do movimento, “a reforma agrária não é apenas o assentamento de novas famílias, ela tem que conjugar o assentamento de novas famílias em novas áreas desapropriadas pelo governo federal”. Rodrigues reconhece que há importância no processo de regularização fundiária feito pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), mas acrescenta que isso é insuficiente para caracterizar um processo de reforma agrária.
José Juliano de Carvalho Filho, professor aposentado da Faculdade de Economia e Administração da USP (FEA/USP) e membro da Associação Brasileira de Reforma Agrária (Abra), também é categórico ao afirmar que o MDA pouco tem feito para a solução da questão agrária no país. Segundo ele, o que tem sido feito é “uma política de assentamento muito parecida com a dos governos passados”, recheada de números ilusórios.Mecanismos destruídosNão é só nos dados equivocados que se percebe a reticência do governo em relação à reforma agrária no país. No dia 15 de dezembro do ano passado, o Senado aprovou a municipalização do Imposto Territorial Rural (ITR), o que caracteriza um forte golpe ao avanço da reforma agrária no país.
Criado juntamente com o Estatuto da Terra pelo governo militar em 1964 – estatuto este que foi a primeira lei de reforma agrária do país e tinha um importante aspecto progressista, já que havia sido trabalhado por técnicos desde o mandato de João Goulart -, o ITR seria aplicado, teoricamente, de uma maneira progressiva, caso o proprietário das terras não aumentasse a sua produção. O montante recolhido iria diretamente para o Incra, que o utilizaria no custeamento do processo de reforma agrária no país.No entanto, o ITR nunca foi cobrado da maneira adequada, e nunca houve um mecanismo que possibilitasse repreender o fazendeiro que não estivesse pagando o imposto.
aplicada da maneira como foi proposta -, o governo também prejudicou o trabalho da Receita Federal ao sancionar a lei de municipalização, uma vez que o cruzamento dos cadastros do ITR com o imposto de renda dos fazendeiros não poderá mais ser feito.
Acabou-se também com o poder do Incra de expropriar terras improdutivas pelo valor declarado no ITR pelos fazendeiros – sempre baixo, uma vez que é o proprietário quem outorga um valor a cada hectare de terra que possui. Após três anos de decepções, o governo parece não dar sinal de que trabalhará para resolver a questão agrária no país. Entra nos registros de nossa história o triste estigma de que o primeiro governante oriundo das camadas populares não se empenhou na consecução de uma premente reforma agrária, um dos maiores anseios da pátria tupiniquim.
Mateus Alves é jornalista.Email: mateus@correiocidadania.com.br
Mateus Alves é jornalista.Email: mateus@correiocidadania.com.br
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